Inspirado no artigo de Hao Nan, pesquisador do Charhar Institute, publicado no South China Morning Post (SCMP)

A Nova Rota da Inteligência Artificial

Imagine um tabuleiro global onde a peça mais valiosa se chama “inteligência artificial”. Agora, visualize a China não apenas movendo suas peças com precisão cirúrgica, mas reescrevendo as regras do jogo. Essa é a realidade que está se desenhando nos bastidores do avanço tecnológico mundial.

A expansão da China no campo da IA está transformando não só o cenário da inovação, mas também as relações de poder entre os países, com foco especial nas regiões do Sul Global: África, América Latina e Sudeste Asiático.

Mais que Tecnologia: Uma Nova Ordem Digital

A China não quer apenas ser líder em inovação — ela quer moldar o futuro digital do planeta. Desde 2017, o governo chinês segue seu ambicioso plano estratégico: o Programa de Desenvolvimento da Nova Geração de IA, com o objetivo declarado de assumir a liderança global até 2030.

Para isso, Pequim aposta em três cartas poderosas:

  • Produtos acessíveis e otimizados para baixa infraestrutura, ideais para países em desenvolvimento.

  • Investimento pesado em infraestrutura digital, como fibra óptica, data centers e redes 5G.

  • Influência crescente na governança global da IA, promovendo um modelo alternativo ao ocidental.


IA Chinesa: Feita Sob Medida para Mercados Emergentes

Enquanto EUA e Europa ainda debatem regulações, a China já está na prática. Empresas como Huawei, Xiaomi e BYD têm IA integrada em dispositivos do dia a dia — de celulares a carros elétricos — com custo acessível e funcionalidade robusta. Isso facilita o acesso em regiões com infraestrutura digital limitada.

Além disso, a IA chinesa não exige supercomputadores para funcionar. Ela é projetada para rodar em aparelhos mais simples, democratizando a tecnologia para milhões de pessoas.


Muito Além do Software: A Infraestrutura Invisível

A China está literalmente cavando o caminho do futuro: o Cabo da Paz, uma rede de fibra óptica submarina, conecta continentes e fortalece laços com países parceiros. E isso é só o começo:

  • Mais de 1,9 milhão de torres 5G instaladas em regiões do Sul Global;

  • O sistema de navegação BeiDou, alternativa ao GPS dos EUA, já opera em mais de 100 países.

O Outro Lado da Moeda: IA, Vigilância e Soberania

Com grande poder vem… preocupações. Tecnologias como reconhecimento facial, policiamento preditivo e vigilância urbana já estão ativas em países como Etiópia, Nigéria e Indonésia. Embora aumentem a segurança e eficiência urbana, levantam debates sobre censura e controle autoritário.

Pequim oferece um modelo pragmático e centralizado, enquanto o Ocidente insiste em regulações e direitos digitais. Isso torna a IA um campo de disputa não apenas econômica, mas ideológica.


A Guerra dos Dados

IA só aprende com dados — muitos dados. A crescente presença digital chinesa em países em desenvolvimento garante acesso a volumes gigantescos de informações linguísticas, comportamentais e econômicas. É um ciclo poderoso: mais usuários = mais dados = IA mais eficiente = mais usuários.


Uma Nova Guerra Fria Digital?

Enquanto a China avança com parcerias e soluções prontas, EUA e Europa tentam contra-atacar com iniciativas como a Parceria Global para IA e novos investimentos na África e América Latina.

O que o futuro reserva?

  • Um mundo fragmentado, com ecossistemas tecnológicos rivais;

  • Ou uma governança global cooperativa, baseada em ética e padrões comuns.

Pelo ritmo atual, o primeiro cenário parece mais provável.

Conclusão: Entre Progresso e Controle

A IA chinesa não é apenas uma vitrine de inovação. É uma ferramenta estratégica de influência global. E o Sul Global — onde as regras ainda estão sendo escritas — é o terreno fértil onde esse novo império digital floresce.

A pergunta que fica é: até onde o mundo está disposto a aceitar tecnologia de ponta se o custo for a liberdade digital?